Chegou a hora e a vez do samba aqui no Cafonália. E pra começar, um samba
diferente, sofisticado, um samba com piano. Apesar de ser até hoje
considerado o principal estilo musical do Brasil, o samba começou por baixo,
considerado um estilo vulgar, marginal, de gente pobre e fuleira. Algo como o
funk hoje. Mas na época do nacionalismo de Vargas, consagrou-se e acabou por
se transformar numa espécie de música oficial do país. E, é claro, graças
também à genialidade de nossos sambistas. E várias modalidades de samba
surgiram. Até samba chic! caso da prestigiada bossanova. Prestígio que nosso
primeiro sambista do blog não gozou; mas ele foi um músico que trouxe
sofisticação ao samba, ao tocá-lo ao piano, embora a bossanova também o fizesse,
só que com mais distanciamento do samba. Todavia, apesar do sucesso nos anos
70 e 80, BENITO DI PAULA é hoje um sambista pouco lembrado, e muitas vezes
mais associado à música brega do que ao samba (bom, eu gosto dos dois!).
Enfim, independentemente do rótulo, Benito é um músico excepcional, que
possui músicas lindíssimas, e que ainda será considerado um dos grandes da MPB.
Neste post ele estará (muito bem) acompanhado de seu filho RODRIGO VELLOZO
e do ótimo ZECA BALEIRO. Aumentem o volume,
porque isso é SAMBA JÓIA!
VIOLÃO NÃO SE EMPRESTA A NINGUÉM
E para apresentar nosso "brinco de ouro", ninguém menos que nosso querido mestre de cerimônia: Chacrinha!! O vídeo é uma relíquia dos anos 70, e nele o Velho Guerreiro apresenta nosso sambista como "a grande revelação do ano" - de 1972(*). Esta música foi gravada no álbum "Ela", desse mesmo ano. Benito di Paula é o pseudônimo de Uday Vellozo, nascido em 28/11/1941 em Nova Friburgo, no estado do Rio de Janeiro.
(*) Alguns comentários no youtube apontam o vídeo como sendo de 1974.
Benito di Paula
AH COMO EU AMEI
Benito di Paula iniciou sua carreira como crooner, em sua cidade, mas logo mudou-se para a capital, o Rio de Janeiro, onde conviveu no morro com os sambistas autênticos, e se manteve firme no propósito de fazer samba, embora a maré dos anos 60 estivesse para o lado do iê-iê-iê. Segundo o cantor: "Lá, meu camarada, era realmente impossível. O pessoal estava mais interessado no som importado do que no nacional. Era uma luta conseguir tocar e cantar música brasileira e agradar".Mais tarde mudou-se para Santos, e após dois anos radicou-se na cidade de São Paulo. O vídeo a seguir é de mais uma apresentação no Programa do Chacrinha, agora em 1981.
Benito di Paula
CHARLIE BROWN Benito acabou criando um samba original, latinizado, romântico, logo identificado como "sambão jóia", que remetia ao visual do artista, que usava cabelos longos, barba e bigode, vestia fraque ou smoking e trazia o pescoço e os braços sempre cobertos de "jóias" (ou bijuterias?). Mas que também podia remeter à sofisticação de um samba tocado ao piano pelo próprio Benito. Foi logo tachado de "brega-chique".A música "Charlie Brown" foi gravada no álbum "Benito de Paula - gravado ao vivo", de 1974.
Benito di Paula
RETALHOS DE CETIM I
Esta música, gravada em um compacto de 1973, e no álbum "Um novo samba", de 1974, foi o maior sucesso do cantor e compositor, e a música que o tornou uma estrela nos anos 70, vendendo tanto quanto Roberto Carlos. Inclusive chegou a lançar discos e turnês no exterior. Também chegou a compor algumas músicas para o Rei. Em seu álbum anterior também gravou compositores famosos, como o próprio Roberto, além de Erasmo Carlos, Chico Buarque, Tim Maia, Vinicius e Toquinho, Taiguara e Ivan Lins. Mas esse disco não chegou a fazer sucesso. Retalhos de Cetim é pura emoção; eu me arrepio todas as vezes que a escuto. Sugiro até fechar os olhos para apreciar melhor esta obra-prima.
Benito di Paula
RETALHOS DE CETIM II
O maranhense Zeca Baleiro nasceu em 11/04/1966, e gravou seu primeiro álbum em 1997, "Por onde andará Stephen Fry?". Misturando rock, MPB, samba e vários outros ritmos, Baleiro tornou-se um dos mais respeitados nomes de nossa música. Mas não se deslumbrou com o "lado chic" da música brasileira e busca suas referências sem qualquer preconceito.Ao gravar essa ótima versão de "Retalhos de cetim", mostra que é um cantor não acomodado e realmente antenado com a música deste país.
Zeca Baleiro
ALÉM DE TUDO
E por último a música "Além de Tudo", interpretada respectivamente por Rodrigo Vellozo, filho de Benito di Paula, por Zeca Baleiro e pelo próprio Benito. Rodrigo, de sólida formação erudita em piano, acompanha o sambista em seus shows. Também iniciou carreira solo, fazendo um samba ainda mais sofisticado que o do pai, com piano e violoncelo. Lançou seu primeiro álbum com o sugestivo nome de "Samba de Câmara". Luxo demais pra este blog!
Rodrigo Velozzo, Zeca Baleiro e Benito di Paula
É interessante notar essas várias visões sobre o samba, que nasceu marginal, virou símbolo nacional, música oficial, dividiu-se em inúmeros estilos, ora desprezado, como o pagodão, ora louvado, como a bossanova. Benito di Paula acaba sendo um ícone disso tudo, meio brega, meio chic, samba do morro, piano, latinidade, romantismo... Enfim, o que não dá pra negar é o seu imenso talento e a beleza de sua música, visceral, original, emocionante. Brega ou não, o que importa? Importa o talento, importa a beleza, importa a música do grande Benito di Paula. Palmas a Zeca Baleiro, que soube reconhecer e valorizar essa pérola de nossa música. Palmas para o filho Rodrigo, que apesar da formação clássica, "não deixa o samba morrer"! Ah como eu amei!